PARA SEMPRE CLARA
Há três dias assisti o filme ‘Aquarius’
e realmente, Sônia Braga estava um arraso, esbanjando talento e muita
elegância. Muitas coisas durante o longa,
mesmo que abordadas em cenas rápidas, me chamaram a atenção, como, por exemplo,
os obstáculos enfrentados pela mulher, durante a tentativa de arcar com toda a expectativa
da sociedade, depositada sobre elas (sobre nós); ou ainda, os estereótipos sobre o que é ser
negro e/ou pobre e como a justiça, de certa forma, negligencia essa grande
parcela da população brasileira. Mas acima de tudo, algo tem ocupado meus
pensamentos nesses três dias ‘pós-Aquarius’: o valor da memória.
O P. está na sua cidade natal, passando
a semana com o avô que sofre de Alzheimer. Falando disso, conversamos muito sobre
como deve ser difícil e penoso perder quem você é, suas lembranças, seus sonhos e sua
própria história. Foi aí que pensei que não só uma doença faz isso com as pessoas, mas nosso pior inimigo, muitas vezes, melhor amigo, essa dicotomia
louca que eu tentei simbolizar na minha pele através do desenho da ampulheta, o
tempo também é provocador do esquecimento. Sem percebermos, ele vai nos levando
tudo e quando nos damos conta (tarde, geralmente), estamos caminhando
entorpecidos e vegetativos pela vida.
Quando Clara (personagem
interpretada por Sônia) se nega a vender a casa onde seus filhos nasceram e
cresceram e onde guarda suas fotografias e discos de vinil, acúmulos de uma
vida inteira, enfrentando assim, os interesses capitalistas que buscam demolir
o que parece velho e insignificante, e construir o novo, sinônimo do progresso
e inovação, ela está preservando muito mais do que um apartamento antigo...ela
está conservando quem ela é e quem um dia ela foi ou sonhou ser. Por isso soou
tão importante pra personagem, tentar se lembrar do nome da empregada do
passado que cozinhava bem; deve ser por isso que soa tão importante pra mim
escrever sobre tudo que posso, ou guardar todas as fotos e vídeos dos meus
momentos preferidos, antes que esses momentos acabem, mesmo eles parecendo eternos.
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